2024/03/29

"Boa noite e boa sorte" - A margem europeia

Público, 29/3/2024

 

O verdadeiro desafio que o Governo Montenegro terá - como qualquer governo de direita ou do PS - será o de cumprir as suas promessas e, ao mesmo tempo, satisfazer as intenções de quem estiver à frente das instituições europeias. Como já referimos (aqui e aqui), não vai ser fácil. 

Desde a pandemia e face à maior recessão de sempre, as instâncias europeias quebraram os seus cânones: mantiveram as medidas de intervenção do BCE do tempo para domar mercados financeiros adotadas na crise de 2007/8 e apoiar as dívidas públicas nacionais, incentivaram os Estados a intervir para atacar os efeitos sociais da recessão e, para isso... suspenderam a obrigação de os Estados convergirem para os valores  fixados em 1992 em Maastricht para o défice orçamental (3% do PIB) e dívidas públicas (60% do PIB). E  tudo teve um elevado sucesso económico! 

Mas passado o temporal, eis que tudo volta à estaca zero. Como se não houvesse memória, Bruxelas e Frankfurt - e os nossos comentadores nacionais - voltam a enumerar os velhos princípios de convergência nominal, como se fosse a única cartilha. E como se fizessem sentido fixar metas universais para economias tão distintas entre si.

--> Os Estados voltam a ter reduzir o seu défice orçamental para que se reduza a sua dívida pública - ou seja, reduzindo a intervenção do Estado, reduzindo apoios sociais, serviços públicos, tudo com efeitos recessivos e maior desemprego. E isso esquecendo que é possível aumentar o défice orçamental - e impulsionar a economia, caminhando para o pleno-emprego - ao mesmo tempo que se reduz o peso da dívida no PIB. Basta que a economia cresça mais do que o valor da taxa de juro subjacente ao pagamento da dívida.   

--> Caso contrário essa obrigação não seja acatada, caso os Estados não implementem essas reformas de redução de intervenção pública, então as instituições europeias não os apoiarão em caso de ataque especulativo pelos mercados financeiros. Ou seja, é Bruxelas e Frankfurt que determinam, em última instância, se as promessas poderão ou não ser cumpridas. Se o povo votou nesse sentido, isso torna-se um pormenor.

E isso quando a política anti-crise funcionou. No fundo, revela-se como a questão de poder. 

Estejam, pois, atentos, povo que elegeu um Parlamento de direita.  

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